NISE MAGALHÃES DA SILVEIRA ( 1905 - 1999), fundadora do Museu de Imagens do Inconsciente, era Psiquiatra, Neurologista, ativista política não atuante, segundo ela. Foi reconhecida, mundialmente, por sua contribuição à psiquiatria no que diz respeito à abordagem clínica dos pacientes psiquiátricos, especialmente, os esquizofrênicos que eram tratados na época com métodos invasivos e violentos por meio de confinamento, uso inadequado de eletrochoque, insulinoterapia e lobotomia. Buscou um tratamento humanizado, usando a arte como terapia, fato que contribuiu para revolucionar a história da psiquiatria no Brasil e no mundo. Portanto, Nise foi pioneira do que hoje conhecemos como a luta antimanicomial.
Nasceu na cidade de Maceió, capital de Alagoas. Filha única do professor de matemática Faustino Magalhães da Silveira e da pianista Maria Lídia da Silveira. Já casada com o médico sanitarista Mário Magalhães da Silveira (1905-1986), mudou-se para o Rio de Janeiro em 1927. Foi a primeira mulher a cursar Medicina na Faculdade de Medicina da Bahia entre os anos de 1921 a 1926
Nos anos 1930, Nise militou no Partido Comunista Brasileiro e foi uma das poucas mulheres a assinar o Manifesto dos trabalhadores intelectuais ao povo brasileiro. Em 1933, especializou-se em neurologia e psiquiatria. Foi aprovada em um concurso para trabalhar no Serviço de Assistência a Psicopatas e Profilaxia Mental do Hospital da Praia Vermelha.
Em 1936, na Ditadura Vargas, Nise foi presa pela primeira vez, por ter trabalhado como médica voluntária na União Feminina Brasileira, mas solta no mesmo dia. Porém, um mês depois, foi levada ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e depois, transferida para o Presídio Lemos de Brito, na Rua Frei Caneca, onde permaneceu 455 dias presa até 21 de junho de 1937.
Na prisão, conviveu com o escritor Graciliano Ramos (1892-1953) , tornando-se a personagem Dra. Nise em seu livro Memórias do Cárcere. Quando retornou da clandestinidade em 1944, foi reintegrada ao serviço público e iniciou seu trabalho no Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro, hoje Instituto Municipal Nise da Silveira.
Em 1946, Nise fundou a Seção de Terapêutica Ocupacional e Reabilitação para incentivar o uso da arte por meio dos diferentes ateliês com o objetivo de proporcionar aos doentes mentais formas de se expressarem, manifestando imagens do seu inconsciente.
Em 1952, Nise criou o Museu de Imagens do Inconsciente no Rio de Janeiro como um centro de estudo e pesquisa interdisciplinar destinado à preservação das obras de modelagem e pintura produzidas pelos esquizofrênicos, que até então, eram mantidos isolados. Essa instituição abriga hoje um acervo de cerca de 350 mil obras de artistas históricos e como temos Arthur Amora, Fernando Diniz, Abelardo Corrêa, Emygdio de Barros, Octávio Inácio, Adelina Gomes e Carlos Pertuis, entre outros. E artistas contemporâneos como Carla Muaze, Davi Pereira da Silva, Edson Luis Antunes, entre outros.
Em 1957, realizou em Zurique, a amostra intitulada A Arte e a Esquizofrenia no II Congresso Internacional de Psiquiatria. Nise da Silveira estudou no Instituto Carl Gustav Jung em dois períodos, de 1957 a 1958 e outro período de 1961 a 1962 em Zurich. Ao retornar ao Brasil, presidiu o Grupo de Estudos Carl Jung até 1968. Escreveu o livro Jung: Vida e Obra, publicado em 1968, sendo considerada pioneira na difusão da psicologia analítica de Jung.
De 1983 a 1985, Leon Hirszman, cineasta, realizou o filme Imagens do Inconsciente, uma trilogia criada a partir de um roteiro idealizado por Nise da Silveira. Foi membro fundadora da "Societé Internationale de Psychopathologie de l'Expression, sediada em Paris.
Publicou em 1998, o livro Gatos, A Emoção de Lidar, sendo uma pioneira na pesquisa das relações emocionais entre pacientes e animais, considerados por ela como coterapeutas. Chegou a ser agraciada com diversas condecorações, títulos e prêmios em diferentes áreas do conhecimento. Em 2003, o Conselho do IPHAN aprovou, por unanimidade, o tombamento das principais coleções do Museu, na época, com 128 mil obras.
Eu não sou uma senhora filantrópica, de jeito nenhum. Sou uma pessoa curiosa do abismo. Embora tenha consciência de que o abismo é tão profundo, e que eu apenas passe nas bordas. (Silveira, Nise)
Faleceu em 1999, aos 94 anos no Rio de Janeiro.
Museu de Imagens do Inconsciente - O Museu Vivo de Engenho de Dentro (saude.gov.br)
VIRGINIA LEONE BICUDO (1910-2003) foi a fundadora da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP) e da Sociedade de Psicanálise de Brasília (SPBsb). Mulher, socióloga e psicanalista negra, Virgínia foi a primeira analista mulher negra não médica no Brasil. Uma das primeiras professoras universitárias negras no país.
Fez um dos primeiros trabalhos acadêmicos sobre o racismo no Brasil nos primórdios da institucionalização universitária das ciências sociais no país, realizou pesquisas sobre as relações raciais, a partir das interfaces entre sociologia, antropologia, psicologia social e psicanálise.
Seu estudo pioneiro de Virgínia Bicudo sobre a Frente Negra Brasileira (FNB), constatou que a discriminação racial no Brasil não só estava presente nas relações sociais como configurava um preconceito que minimizava o confronto direto e impedia o desenvolvimento da consciência sobre a discriminação. Seu estudo defende a tese de que o critério da aparência calcado no branqueamento constituiria o principal determinante das oportunidades de ascensão social do negro no Brasil.
Nascida em 1910 na cidade de São Paulo, filha de Giovanna Leone, imigrante italiana, e de Teófilo Bicudo, descendente de escravos negros. Virgínia, desde cedo, teve contato com o preconceito racial.
Na Escola Normal Caetano de Campos se formou em educadora sanitária. Junto com Lygia Alcantara do Amaral, prestou serviços de assistência educacional, sanitária e médica às crianças e suas famílias, ligada à Cruzada Pró-Infância, no cenário da Revolução Constitucionalista de 1932. Recebeu o grau de bacharela em Ciências Políticas e Sociais, pela Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo, no dia 1º de março de 1939, sendo a única mulher da sua turma.
Realizou em 1945 o Mestrado em Sociologia pela Escola Livre de Sociologia e Política, defendendo a dissertação Estudo de atitudes raciais de pretos e mulatos em São Paulo, primeiro trabalho de pós-graduação em Ciências Sociais no Brasil a tratar de relações raciais. Recentemente sua dissertação foi republicada e tem como mérito a recusa de formulações raciais de cunho biológico para se pensar a raça como categoria social.
Em 1949, compôs a equipe do projeto Unesco-Anhembi sobre relações inter-raciais no Brasil, publicando o estudo “As atitudes raciais na vida escolar”, que trazia uma rica investigação sobre os aspectos psicossociais do preconceito racial.
O encontro com Durval B. Marcondes, ocorrido quando cursava sociologia, representou um dos pontos de virada de seu caminho rumo à psicanálise. Em 1940, Virgínia e Durval assumiram a cadeira de psicanálise e higiene mental na Escola Livre de Sociologia e Política. A disciplina se voltava para o contexto familiar e educacional, enfatizando os cuidados preventivos relacionados à saúde psicológica das crianças.
Virgínia escrevia textos sobre situações do cotidiano, transmitido pela rádio Excelsior, idealizando o programa Nosso Mundo Mental que foi não apenas bem-sucedido em divulgar as ideias psicanalíticas como ganhou credibilidade junto ao público.
Em 1955, Bicudo viajou a Londres e frequentou cursos no Instituto de Psicanálise da Sociedade Britânica. Tornou-se especialista em psicanálise da criança na Tavistock Clinic, sob a supervisão de Esther Bick. Estabeleceu contatos com Melanie Klein, Wilfred Bion e Frank Philips, entre outros.
Em 1956, foi lançado em São Paulo o livro Nosso Mundo Mental, organizado a partir do programa da rádio Excelsior, apresentado por Virginia e de sua coluna no jornal Folha da Manhã. Trata-se de uma obra de difusão científica utilizando meios de comunicação de massa.
Na década de 1960, de volta ao Brasil, após cinco anos de estudos na Inglaterra, Virgínia Bicudo tornou-se professora e diretora do Instituto de Psicanálise da Sociedade Brasileira de São Paulo, criando ainda o Jornal de Psicanálise.
Nos anos 1970, dando continuidade a seus esforços em prol da institucionalização da psicanálise no país, fundou a Sociedade de Psicanálise de Brasilia (SPBsb) e a Revista de Estudos Psicodinâmicos ALTER.
Em 1976, iniciou o curso de Formação de Analistas de Crianças da SPBsb. No decorrer das décadas de 1980 e 1990, continuou a participar de conferências, jornadas, encontros e elaborando artigos científicos.
Virgínia foi educadora sanitária, visitadora psiquiátrica, cientista social, professora universitária, psicanalista, divulgadora científica, protagonista de diversas iniciativas no plano da institucionalização da psicanálise no Brasil.
Redigiu colunas na imprensa, defendendo suas ideias sobre a função social do psicanalista e colaborou na criação do Jornal de Psicanálise do Instituto Durval Marcondes. Em editorial de 2004, essa revista se referiu a ela como "uma das primeiras psicanalistas brasileiras com trânsito e publicações internacionais"
Faleceu em 2003, aos 93 anos, na cidade de São Paulo
REFERÊNCIAS
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63704390
Algumas notas sobre a trajetória de Virgínia Leone Bicudo | SBPSP
Virgínia Leone Bicudo - Sociedade Brasileira de Sociologia (sbsociologia.com.br)
Virgínia Leone Bicudo – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)
BICUDO, Virgínia Leone. Atitudes raciais de pretos e mulatos em São Paulo (Edição organizada por Marcos Chor Maio). São Paulo, Editora Sociologia e Política, 2010 [1945].
BICUDO, Virgínia Leone. Nosso mundo mental. São Paulo, Instituição Brasileira de Difusão Cultural, 1956.
BICUDO, Virgínia Leone. Atitudes dos Alunos dos Grupos Escolares em relação com a Cor dos seus Colegas. In: BASTIDE, Roger; FERNANDES, Florestan. Relações raciais entre negros e brancos em São Paulo. São Paulo: Anhembi, 1955. p. 227–310.
BICUDO, Virgínia Leone. Contribuição ao estudo das condições de trabalho e da personalidade de mestres de indústria em São Paulo. Sociologia, v. XI, n. 2 e 3, vol. XI, nº. 2 e 3, 1949, p. 223-252 e 381-399
BICUDO, Virginia Leone. “Atitudes Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo”. Sociologia, vol. IX, nº 3, pp. 196-219, 1947.